QUANDO A ÚNICA FERRAMENTA É A OBSERVAÇÃO

Autor(a):
Julio Turbay

Publicação:

Artigo publicado na Revista CIPA de agosto de 2007.

 

 

É evidente o esforço que as grandes organizações vêm realizando no intento de reduzir os acidentes e criar ambientes de trabalho mais seguros. E é fato que a diminuição dos acidentes têm obedecido a uma lógica bastante clara, quanto mais se trabalha na melhoria das condições de trabalho, seguido da implantação de boas práticas de gestão de segurança, o resultado fica mais próximo do que se espera.

 

Porém é uma percepção em comum por parte das empresas que após estes dois aspectos citados nasce um desafio diferenciado que é o de atuar sobre o comportamento das pessoas, ou de forma mais ampla, sobre o fator humano. Ouve-se com freqüência por parte dos profissionais do SESMT frases como: “Já fizemos de tudo que tinha que ser feito, agora precisamos trabalhar no ser humano”.

“Nosso problema está no comportamento das pessoas”.

 

Comumente, as organizações, iniciam um processo de identificação de práticas e ferramentas que possam auxiliá-las na atuação sobre o fenômeno humano. Uma das iniciativas mais tradicionais é iniciar um processo de segurança baseada no comportamento pela prática da observação comportamental, ferramenta largamente utilizada e que demonstra excelentes resultados. DePasquale e Geller (1999) apontam os fatores críticos de sucesso deste processo em uma pesquisa realizada em 20 empresas americanas que utilizam esta ferramenta e citam que o sucesso desta prática está seguramente vinculada a três fatores essenciais, que seguem:

 

  1. Treinamento: as empresas devem propiciar treinamento para seus observadores.
  2. Participação da liderança: segundo os autores a liderança tem que ser o principal agente na disseminação da cultura de observação dos comportamentos.
  3. Confiança interpessoal: apontado como um fator primordial para o sucesso do processo, deve levar em conta o nível de confiança existente nas relações interpessoais em todos os níveis da organização.

 

Não há duvidas que esta ferramenta deve ser utilizada, porém o que devemos questionar é se seu uso indiscriminado e isolado, ou seja, utilizado como única alternativa sobre a modificação dos comportamentos humanos, é realmente eficaz.

 

Alguns aspectos importantes da cultura de segurança da organização devem ser levados em conta para a efetivação de um processo como o de observação comportamental, que são:

 

  1. Comprometimento com a vida: se para sua organização segurança é realmente um valor ela está dando um passo importante em direção a uma cultura de segurança positiva. Para todos deve ficar claro que ao declarar que segurança é um valor para a organização ela diz com isso que ali não se negocia com a vida das pessoas. Pergunte-se: sua organização define regras e as cumpre ou existem momentos onde algumas pequenas quebras são possíveis como, por exemplo, em uma parada de manutenção, ou em nome da produção, ou para agilizar aquela entrega para um importante cliente. Se você está na dúvida, talvez seja interessante analisar.

 

  1. Processo de educação continuada em segurança: se a sua empresa possui um plano de treinamento em segurança baseado em levantamentos de necessidades, com boas sistemáticas de avaliação de eficácia, linkados à realidade do pessoal operacional esse pode ser um bom indicador. Porém fique atento, pois se para sua organização treinar as pessoas em segurança significa apenas fazer uma integração e SIPAT é interessante você analisar com mais calma a implantação de processos de Observação Comportamental.

 

  1. Responsabilidade Compartilhada: Organizações com cultura de segurança diferenciada devem deixar claro para todos os funcionários que a responsabilidade por segurança deve estar em todos os níveis, ou seja, na agenda de reuniões da alta administração, nas práticas gerenciais, nas tomadas de decisão de cada funcionário. Se na sua empresa você pergunta por quem faz segurança e te enviam para o SESMT, o desafio será ainda maior.

 

  1. Visão de longo prazo: se em sua empresa a segurança é feita de forma diária focada nos principais problemas e com foco não em correções (que são pontuais), mas em ações corretivas (que levam em consideração as causas reais dos problemas) o potencial de sucesso da Observação comportamental aumenta. Mas fique de olho, pois se a segurança é feita por campanhas (normalmente voltadas para a melhoria para auditorias) pode ser uma forma de entender que a segurança para a sua organização pode ser uma moda passageira.

 

  1. Avaliação constante do Clima de segurança: que nada mais é do que entender a percepção dos trabalhadores em relação à segurança. Vale ressaltar que é comum identificarmos em algumas organizações aqueles projetos que são apontados como a salvação, mas que em geral não são nem conhecidos pelos trabalhadores. Lembre-se que o ideal é que conheçamos o nível de satisfação dos usuários da segurança para melhorar e ou mesmo potencializar aquilo que é bem feito.

 

  1. Política de Conseqüências: que pode ser entendido como um indicador importante da maturidade da organização em relação ao seu sistema de gestão de segurança, aqui a organização deixa claro quais são os reconhecimentos e sanções possíveis relacionados à segurança. As empresas devem estar atentas a suas práticas e devem atuar de forma transparente e coerente com sua realidade. Se a sua organização reconhece sem critérios (entrega brindes indiscriminadamente) ou pune aqueles que lhe convêm, fique atento, pois não será fácil trabalhar com Observação Comportamental em sua empresa.

 

Estes critérios apresentados têm como foco uma provocação para as organizações que compram processos de Observação Comportamental sem levar em conta a grande diversidade de fatores que devem ser avaliados.

 

Estimular o comportamento seguro também pressupõe um grande investimento da empresa na melhoria da liderança, em processos seletivos mais adequados, em programas de educação continuada, no bom planejamento das ações humanas e também na observação comportamental. Ela deve ser uma ferramenta a mais e não a única alternativa, naquele que é possivelmente um dos maiores desafios para a gestão das organizações: a prevenção dos acidentes de trabalho e principalmente a promoção da saúde das pessoas no ambiente de trabalho.

 

Lembre-se: trabalhar com segurança é um desafio diário.

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